Episodio# 1 - A maka de Sanza-Pombo
Evitar novos Sanza-Pombo
« Parece que o passatempo preferido do Homem, ao longo da história, é matar o seu vizinho », assim começa a nota final do excelente livro de Milan Rados « Mundo e Comunicação », com uma breve viagem sobre os grandes eventos e momentos da história política contemporânea, marcados essencialmente pela presença constante do conflito.
Ainda hoje, quando olhamos ao que se passa entre nós e também ao que se passa co mundo, a tónica do conflito está sempre presente. Para não irmos longe, chamo atenção para a Guiné-Bissau, Moçambique ou ainda o Sahel. Obviamente não podemos ignorar a mediática guerra entre a Rússia e a Ucrânia, tendo por trás uma disputa que olha fundamentalmente para os elementos do território bem como a busca pelo poder político.
É isso que vai me deixando com alguma preocupação. Nos últimos dias, tivemos um incidente político absolutamente indisculpavel ou indefensável. Já não importa quem fez ou quem provocou. A violência é condenável e ponto. Há um campo das liberdades individuais que não pode ser condicionada – essa violência não só gera violência como no final do dia pretende condicionar os outros – como também é relevante dizer que a liberdade exige responsabilidade. Precisamos preparar as pessoas para aprenderem a viver e a conviver num espaço de absoluta liberdade onde ao mesmo tempo respeita-se a liberdade do outro.
Ademais, num momento tão sensível como esse de pre-campanha eleitoral, onde os partidos políticos começam a olear a sua máquina para a disputa, é também importante que os partidos que concorrem verdadeiramente ao poder, falo do MPLA e UNITA, precisam abraçar o diálogo e a sã convivência, fazendo-nos perceber que essa disputa política é feita com elevação em prol do bem comum e devemos cultivar sempre o princípio da inclusão. Quem ganha não pode deixar de ouvir mas quem perde deve aceitar a sua condição e não funcionar como elemento de bloqueio para a governação. Como escreveu o Gustavo Costa, « as eleições não são a vida ou a morte » ou ainda, « com ou sem a Unita no poder, com ou sem o MPLA na oposição, depois de Agosto a vida continua ».
Ora, os incidentes de Sanza-Pombo são graves mas não devem servir para diabolizar ninguém na midia, antes o mote para um tratamento pautado pelo rigor jornalístico, o mesmo que nos exige um tratamento mais decente as forças da oposição e sociedade civil em toda a midia. Hoje, como em toda a hora, devemos apenas seguir a ditadura da objectividade, do facto jornalístico e da separação fina entre a opinião e a verdade. Façamos um esforço nesse sentido!
Os incidentes de Sanza-Pombo fazem-me destapar factos de que não nos podemos orgulhar. Os incidentes de Sanza-Pombo trazem à baila um certo radicalismo político que em nada ajuda a unidade e a reconciliação nacional. Os incidentes de Sanza-Pombo fazer acirrar ódios inúteis, não me espantaria que tal ocorra, naquela localidade entre pessoas que até são parentes. Os incidentes de Sanza-Pombo fazem-me perceber o quanto determinados políticos são ocos e cegos em causas e obsessão desmedida pelo poder, ignorando as lições recentes da história. Em definitivo, não se conquista eleitorado com radicalismos e violência. Isso apenas afugenta.
Mas as lições de Sanza-Pombo fazem-me finalmente recordar Nelson Mandela e os seus ensinamentos do Ubuntu, visto tanto numa abordagem de princípio filosófico quanto de uma ética social. Por isso, a sociedade é sustentada pelos pilares do respeito, da solidariedade, da importância das alianças e do relacionamento das pessoas, umas com as outras. Uma pessoa com ubuntu tem consciência de que é afectada quando seus semelhantes são diminuídos, oprimidos. Portanto, as pessoas devem saber que o mundo não é uma ilha: “Eu sou porque nós somos”. Eu sou humano, e a natureza humana implica compaixão, partilha, respeito, empatia e unidade.
Se assim é, como compreender e aceitar que a política possa criar em nos um fosso tão grande que nos leve a encarar o outro, um irmão, como um inimigo. E por isso, apesar da visão contrária que alguns hoje colocam, aqui está a grandeza de Mandela. A sua compaixão em nome de um interesse superior.
Precisamos cultivar isso em nós. Evitar novos Sanza-Pombo ou, como quem diz, não nos deixarmos instrumentalizar por políticos ou paixões políticas.