Entrevista a Maria Eugênia Neto sobre a prisão de Carlos São Vicente

Entrevista concedida ao Jornalista  Artur Queiroz.
MARIA EUGÉNIA NETO: Carlos São Vicente é Inocente e a sua Prisão ilegal a nossa Família Está a ser Vítima de Injustiças e Abusos

O empresário e investidor Carlos São Vicente continua detido no estabelecimento prisional de Viana e os recursos até agora apresentados para Tribunais superiores têm o mesmo destino de sempre: Condenação sem provas. O Tribunal nem se dignou ouvir duas testemunhas cujos depoimentos arrasavam a acusação e a convicção dos magistrados judiciais. O Presidente da República José Eduardo dos Santos e o PCA da Sonangol, Manuel Vicente, podiam responder a dúvidas que existissem. Mas ninguém os encontrou! A saga da injustiça, da prepotência e do abuso de autoridade continua. O que pensa deste atropelos ao Estado de Direito e Democrático Maria Eugénia Neto, viúva do Fundador da Nação Angolana e militante do MPLA desde a sua fundação? Fomos entrevistá-la.

Artur Queiroz – A família do empresário Carlos São Vicente está em silêncio desde que foi detido em 2020. Quer fazer-nos um ponto da situação?

Maria Eugénia Neto – A família optou pela contenção verbal mas não está passiva. Nunca esteve. Temos acompanhado o processo em todas as suas fases. A nossa expectativa era que fosse feita Justiça. Mas, infelizmente, não foi isso que aconteceu. O processo está cheio de irregularidades, desde a primeira hora.

AQ – Está a referir-se ao momento da prisão preventiva?

MEN – Isso mesmo. O meu genro, Carlos São Vicente, foi preso sem provas. A prisão preventiva começou no dia 22 de Setembro de 2020. Depois de várias prorrogações ilegais atingiu o prazo máximo permitido por Lei, em 26 de Setembro de 2022. Esse prazo foi ultrapassado. Estamos perante uma prisão arbitrária aplicada em manifesto abuso de poder.

AQ – A defesa de Carlos São Vicente recorreu ao Habeas Corpus?

MEN – Demos entrada de um pedido de Habeas Corpus no dia 11 de Outubro de 2022. Até hoje não foi decidido. Como se a liberdade de um cidadão fosse coisa sem valor. Como se fosse aceitável tão grave manifestação de arbitrariedade e abuso de poder.

AQ – Qual foi o argumento que justificou o pedido de Habeas Corpus?

MEN – O fundamento foi o facto do Dr. São Vicente continuar preso além do prazo fixado por lei para a prisão preventiva. O prazo era 26 de Setembro de 2022. O outro fundamento é a ilegalidade porque vários artigos da Constituição e do Código do Processo Penal foram violados.

 

AQ – Carlos São Vicente continua preso enquanto os Tribunais apreciam os seus recursos. Há perigo de fuga ou alarme social?

MEN  – Carlos São Vicente, meu genro, está preso por vingança e por inveja. Tenho pena que ele esteja a sofrer os mesmos desmandos a que foi sujeito Agostinho Neto pela PIDE e o regime colonialista. Mas mesmo esses, depois da deportação para Cabo Verde, colocaram-no em prisão domiciliária. O meu genro continua fechado numa cela da prisão de Viana. Não compreendo esta sanha vingativa nem esta perseguição.

AQ – A Acusação apresentou provas na audiência do julgamento que justificam a condenação em primeira instância?

MEN – Da douta Acusação só sei – e toda a gente sabe – que a Procuradoria-Geral da República, em Agosto de 2020, respondeu a uma Carta Rogatória do Ministério Público de Genebra, garantindo que nada existia contra Carlos São Vicente. Depois de aturadas investigações, as autoridades judiciais angolanas informaram as suas congéneres da Suíça que Carlos São Vicente não tinha cometido qualquer crime em Angola. Este facto tem de ser lembrado. Um cidadão não pode ser considerado inocente pela PGR num dia e criminoso no dia seguinte. Alguém tem de explicar isto à opinião pública. A arbitrariedade tem limites.

AQ – Em Agosto nada existia contra Carlos São Vicente. Mas em Setembro de 2020 foi preso. O que mudou?

MEN – Uns dias depois de ser declarado inocente pela PGR, a mesma instituição deteve Carlos São Vicente e acusou-o de cinco crimes. Algum tempo depois reduziram a Acusação para dois crimes. Ainda conseguiram arranjar mais um crime de fraude fiscal. Não compreendo esta Justiça preconcebida. Isto tem pouco a ver com o Estado de Direito. De inocente, Carlos São Vicente passou a autor de cinco crimes. Mas depois ficaram só dois. E ainda arranjaram mais um.

AQ – Quais são os crimes que subsistem na Acusação?

MEN – São crimes que nada têm a ver com a condição do meu genro, Carlos São Vicente. Ele nunca foi membro do Governo de Angola. Nunca exerceu funções públicas ou políticas. Nunca geriu fundos públicos. Deixou a Sonangol em 2002, logo não pode ter cometido os crimes de que é acusado.

AQ – Como Carlos São Vicente se tornou dono da empresa AAA?

MEN – Muito simples. Carlos São Vicente concebeu uma estratégia de gestão de riscos das operações petrolíferas. Propôs à Sonangol e ao Presidente da República, José Eduardo dos Santos, a criação da empresa AAA para executar essa estratégia. Isso foi aprovado. Mais tarde o meu genro comprou as participações e pagou! Isso está provado com as contas auditadas. Repito. As contas foram auditadas e nelas é claro que Carlos São Vicente comprou e pagou as suas participações na empresa AAA.

AQ – Está a dizer que Carlos São Vicente não cometeu os dois crimes de que é acusado mais o crime de fraude fiscal?

MEN – Claro que não. Ele é inocente. Está na cadeia de Viana um inocente. Nunca imaginei que isto acontecesse no país que ajudei a fundar. Tantos sacrifícios, tanta entrega à luta para acabarmos com as injustiças e conquistarmos a liberdade. E agora voltou tudo ao princípio. Um país democrático não pode ter presos de consciência. Não pode meter na cadeia cidadãos como bodes expiatórios. Se querem lutar contra a corrupção, lutem mesmo.

AQ – Carlos São Vicente é o dono da empresa AAA?

MEN – Toda a gente sabe que sim. Basta consultarem os documentos oficiais. Ele tem 89,89 por cento do capital. Logo não existe um crime de peculato. Isso é uma invenção muito mal engendrada. Os acusadores pensam que vamos ficar em silêncio perante tão graves injustiças. Estão enganados, Nós respeitamos a Justiça. Respeitamos o Estado de Direito. Defendemos a democracia. Por isso não contem com o nosso silêncio e muito menos com a nossa conivência.

AQ – Os edifícios da AAA que a PGR apreendeu e mandou ocupar, de quem são?

MEN – Mais uma ilegalidade gritante, inadmissível num Estado de Direito. Todos os edifícios pertencem à AAA Activos Lda. Esta sociedade é cem por cento do meu genro, Carlos São Vicente. Portanto, os edifícios são propriedade privada. Património da família.

AQ – Qual é exactamente a situação do Dr. Carlos São Vicente?

MEN – Continua preso na prisão de Viana. Foi condenado ilegalmente. Sem provas. E nem sequer quiseram ouvir duas testemunhas que podiam esclarecer tudo, Manuel Vicente, antigo PCA da Sonangol, e José Eduardo dos Santos, na época dos factos Presidente da República. Em rigor não podemos falar de um julgamento. Aquilo foi apenas uma vingança.

AQ – O processo já terminou? A sentença transitou em julgado?

MEN – O processo não terminou. A sentença não transitou em julgado. Neste momento há um recurso extraordinário de inconstitucionalidade a ser apreciado no Tribunal Constitucional. O processo contém mais de uma dúzia de violações de princípios Constitucionais que o tornam ilegal e nulo. Esperamos que seja feita Justiça e que a legalidade seja respeitada.

AQ – O que espera do Tribunal Constitucional?

MEN – Apenas espero que o meu genro, Carlos São Vicente, seja imediatamente libertado. E o património da família seja restituído. Não gosto de falar disto, mas a injustiça e o abuso chegaram a pontos intoleráveis. Por isso, lembro que a nossa família contribuiu decisivamente para a Independência Nacional. Somos credores de respeito. Temos o direito de viver do fruto do nosso trabalho em liberdade e em paz. O Estado de Direito assim o exige. A minha família não pode ser bode expiatório. Exigimos respeito. E Justiça.  

ARTUR QUEIROZ

Data de Emissão: 03-11-2022 às 07:00
Género(s): Entrevista
Tópicos(s): AAA, João Lourenço
PARTICIPANTES

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